Novo estudo mostra que os efeitos do desmatamento sobre a temperatura média nas regiões desmatadas podem ser devastadores. Na Amazônia, esse impacto da derrubada da floresta pode chegar a 1,5 graus centígrados a mais em relação às médias atuais.
Por: Equipe Oásis
Fala-se muito da capacidade das florestas de absorver CO2, o principal gás produtor do efeito estufa, e da importante função mitigadora que elas desempenham nas mudanças climáticas. Mas talvez seja menos conhecida a contribuição que as massas de vegetação densa proporcionam na regulagem da temperatura local. As árvores das florestas possuem a capacidade de refletir a luz solar (albedo) e a propriedade da evapotranspiração (a passagem do vapor aquoso para a atmosfera).
Todas essas funções importantíssimas para o equilíbrio climático do planeta estão mais do que nunca ameaçadas devido ao desmatamento insustentável que acontece nas grandes florestas do mundo, sobretudo nas áreas tropicais e subtropicais.
Se, por exemplo, o desmatamento na Amazônia continuar no ritmo atual, a perda da floresta pode levar, até 2050, a um aumento médio da temperatura da região de 1,5°C. Isso, além de afetar a biodiversidade local, poderá ter impactos econômicos e sociais, incluindo o aumento da ocorrência de algumas doenças infecciosas e da demanda por energia elétrica e água.
Entre agosto de 2017 e julho de 2018, o desflorestamento na Amazônia brasileira aumentou 13,7% em relação ao ano precedente. Foram arrasados 7.900 quilômetros quadrados de floresta para dar lugar a áreas de produção agrícola de produtos para a exportação, tais como a soja e a carne bovina. Esse contexto preocupa ambientalistas e climatologistas de todo o mundo, sobretudo porque o atual Presidente da República, Jair Bolsonaro, demonstrando ignorância da realidade dos fatos, tem se declarado favorável a uma maior exploração econômica da floresta amazônica.
Além disso, os cientistas sabem que o incremento da derrubada das florestas provocará uma redução na produtividade de cultivos. O alerta está em um estudo publicado quarta-feira, 20 de março, na revista PLoS ONE por pesquisadores da Universidade Estadual do Rio (Uerj), da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade da Califórnia em Santa Cruz.
Retirada da cobertura vegetal
O grupo analisou o impacto já sentido da retirada da cobertura vegetal na reflexão da luz solar e na capacidade de evapotranspiração da floresta (perda de água do solo por evaporação e da planta por transpiração) sobre a temperatura do solo em regiões tropicais e o que pode ocorrer no futuro na Amazônia.
De acordo com o trabalho, o desmatamento já promoveu em áreas tropicais da Terra um aumento de 0,38°C entre 2000 e 2010. Mas esse valor é uma média para todas as regiões, considerando um desmatamento também médio para essas de 26% no período. A maioria das áreas analisadas (67%) sofreu menos de 20% de desmatamento. Onde a perda florestal foi mais intensa, o aquecimento observado também é maior.
“Quando olhamos áreas tropicais que sofreram taxas maiores de desmatamento, o aumento de temperatura foi muito maior. Por exemplo, em áreas que perderam 50% de sua cobertura florestal, o aumento médio foi de 1,08°C. Em áreas com 100% de desmatamento, o aumento pode chegar a quase 2°C. Isso provavelmente ocorreu em áreas ao longo do arco do desmatamento da Amazônia”, disse o ecólogo Jayme Prevedello, da Uerj – o primeiro autor do trabalho.
O pesquisador explica que esses valores de aquecimento são uma média entre as temperaturas diurna e noturna. “Se considerarmos apenas a temperatura durante o dia, os aumentos são ainda mais dramáticos. Na média, o aumento foi 0,87°C. Para locais com 50% de desmatamento, foi de 1,7°C, e para 100% de desmatamento, foi de 3°C em média, podendo chegar a 5,1°C”, afirma.
Desequilíbrio dramático
Os autores também mediram os impactos que podem ser sentidos entre 2010 e 2050 especificamente para a Amazônia, em um cenário com taxas de desmatamento em alta semelhantes às atuais e considerando que o Código Florestal seja cumprido. No primeiro cenário, a temperatura pode subir em média até 1,45°C.
“Este nível de aquecimento é dramático em áreas com alto nível de desmatamento e rivaliza com o aumento de temperatura pelas mudanças climáticas. Honestamente, fiquei surpreso com esses valores. Já sabíamos há muito tempo que nas margens da floresta, próximo de uma área desmatada, é muito mais quente, mas não sabíamos que esse nível de aquecimento penetrava em áreas tão grandes”, complementa Barry Sinervo, da Universidade da Califórnia, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo.
Os resultados são consistentes com outros trabalhos que compararam áreas florestadas com pastagem e cultivos de soja. Um estudo de 2015de pesquisadores do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) e do Centro de Pesquisa Woods Hole, em Mato Grosso, mostrou que, quando a floresta é convertida em soja, ocorre um aumento na temperatura da superfície de mais de 5°C. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.