O meio ambiente e as experiências vividas deixam uma “pegada” genética que, embora sem alterar o DNA, podem ser transmitidas durante muitas gerações.
Por: Luis Pellegrini
Graças à ciência, a expressão “fulano foi amaldiçoado até a sétima geração!”, muita usada na Grécia Antiga, está ganhando um novo sentido bastante atualizado com os tempos que hoje vivemos. Parece, com efeito, que os genes dos seres vivos possuem uma espécie de “memória” capaz de permanecer “marcada” pelos efeitos de tudo aquilo que lhes acontece durante a sua existência: a influência do meio ambiente em que ele vivem, as experiências pelas quais passam, as dores, os prazeres, os aprendizados e as experiências. Em resumo, tudo que vivemos e todas as coisas com as quais entramos em contato “marcam” a nossa memória genética e alteram não apenas a nossa própria vida mas também a dos nossos descendentes.
Para começar, sabemos que dois gêmeos univitelinos nascem com o mesmo patrimônio genético mas, durante o crescimento, ambiente, estilo de vida e experiências sofridas modulam, ou seja alteram, a expressão de alguns genes, ativando-os ou desativando-os, de forma que o potencial individual seja exprimido ou suprimido. É por tais razões que dois ou mais irmãos gêmeos desse tipo, embora geneticamente idênticos, podem desenvolver, desde o início, características comportamentais e inclusive físicas diferentes.
Nos vermes, por até 14 gerações
Mas as coisas vão mais longe: Um estudo que acaba de ser publicado na revista Science demonstra que essas importantes “pegadas” ambientais que influenciam o comportamento dos nossos genes podem ser transmitidas durante muito tempo: em alguns casos por até 14 gerações, como demonstra um estudo com vermes nematóides (Caenorhabditis elegans).
Esses invertebrados, que têm um ciclo de vida muito breve, são fáceis de criar e possuem um genoma não excessivamente vasto, razão pela qual são muitas vezes utilizados como modelos em biologia. Cientistas da European Molecular Biology Organisation (na Espanha) introduziram em alguns nematóides um gene que, uma vez ativado, faz com que os vermes brilhem em fosforescência quando estão sob luz ultravioleta.
Memória genética
Quando os vermes foram mantidos a baixas temperaturas (ao redor de 20 graus centígrados) o gene permaneceu pouco ativo; mas, a 25 graus centígrados o gene foi ativado e os animais se tornaram fluorescentes. Uma vez ativado esse gene, os vermes continuaram a ser fluorescentes mesmo quando a temperatura desceu alguns graus, como se conservassem uma recordação daquela expressão gênica. E, ainda mais importante: transmitiram essa “pegada” às 7 gerações sucessivas.
Em uma segunda fase do experimento, quando cinco gerações consecutivas de nematóides foram expostas a uma temperatura de 25 graus centígrados, as mudanças (a fluorescência dos vermes) chegaram a ser transmitidas por 14 gerações consecutivas!
O poder da experiência vivida
Algumas pesquisas recentes sugerem que algo similar pode ocorrer também para o ser humano: experiências significativas de privações e sofrimentos podem ativar ou desativar algumas características genéticas durante várias gerações, sem no entanto alterar o DNA. Os cientistas estudam agora com quais métodos investigar isso experimentalmente usando humanos. Pois, no homem, as coisas não são tão simples como nos vermes…