Aprenda a agradecer. A gratidão leva as pessoas a agir de forma altruísta. “Ela é o ‘fator esquecido’ na pesquisa da felicidade”, avalia Robert Emmons, professor de psicologia da Universidade da Califórnia
Por Eduardo Araia
A gratidão, aquela emoção de agradecimento e alegria que surge no recebimento de um presente ou de um auxílio, tem surgido com destaque cada vez maior nos estudos sobre a felicidade. Velha conhecida de religiões e filosofias, que há muito tempo a consideram uma manifestação fundamental da virtude e um componente básico da saúde, da integridade e do bem-estar, ela vem despontando em estudos que indicam uma relação sólida entre ser grato e sentir-se melhor.
“A gratidão é o ‘fator esquecido’ na pesquisa da felicidade”, avalia Robert Emmons, professor de psicologia da Universidade da Califórnia, Davis, e um dos maiores expoentes na pesquisa desse tema. A opinião é endossada por Todd Kashdan, professor adjunto de psicologia da George Mason University (EUA) e um dos pioneiros da “ciência da felicidade”. Ele declarou que, se tivesse de nomear três elementos essenciais para criar felicidade e dar sentido à vida, estes seriam relacionamentos significativos, gratidão e viver no momento presente com uma atitude de abertura e curiosidade.
A gratidão reforça os vínculos sociais
“Você não pode ser deprimido e grato ao mesmo tempo”, afirma a psicóloga novaiorquina Brenda Shoshanna, autora do livro 365 Ways to Give Thanks: One for Every Day of the Year (Citadel). “(A gratidão) faz uma pessoa mais saudável, fisicamente, mentalmente, em todos os sentidos.”
Em um dos estudos recentes sobre a gratidão, financiado pela National Science Foundation dos EUA, o psicólogo David DeSteno, da Northeastern University, orientava cada participante a concluir uma difícil tarefa de entrada de dados, “perdidos” logo depois supostamente por mau funcionamento do computador. Dispensada, a pessoa deparava em seguida com um assistente de laboratório, a quem poderia pedir auxílio a fim de restaurar as informações perdidas – embora ele aparentemente desconhecesse o trabalho proposto pelo psicólogo e alegasse estar com pressa para realizar sua própria experiência. DeSteno descobriu que aqueles que haviam sido ajudados pelo assistente e estavam gratos por isso tinham maior propensão a retribuir o favor, e o faziam por mais tempo do que os integrantes de um grupo que não havia sido auxiliado.
“A gratidão leva as pessoas a agir de forma virtuosa ou mais altruísta”, afirmou DeSteno, cuja pesquisa foi publicada em 2009 na revista Current Directions in Psychological Science. “E constrói o apoio social, o qual sabemos que está ligado ao bem-estar físico e psicológico.”
Autor de vários livros e monografias relativos ao tema, Robert Emmons tem participado de estudos nessa área que estão ajudando a compor um retrato detalhado das pessoas que manifestam gratidão. Segundo Emmons, elas exibem níveis mais altos de emoções positivas, satisfação com a vida, vitalidade e otimismo. Dormem mais, fazem mais exercícios e sua pressão arterial e seus níveis de depressão e estresse são mais baixos. Demonstram ser simpáticas e conseguem ver as coisas pelos olhos dos outros. Não negam ou ignoram os aspectos negativos da vida, mas aparentemente ampliam os estados associados a sentimentos agradáveis. Em suas redes sociais, elas são consideradas mais generosas e prestativas. As crianças que praticam a gratidão apresentam mais atitudes positivas em relação à família e à escola.
Um dos objetos de estudo de Emmons foram pessoas que escreveram diários nos quais agradeciam semanalmente as benesses que haviam recebido. Esses indivíduos fizeram exercícios físicos com mais regularidade, reportaram um número menor de problemas de saúde, avaliaram melhor sua vida como um todo e demonstraram mais otimismo do que os participantes do grupo de controle, que registraram aborrecimentos ou eventos neutros no diário. Os que manifestaram gratidão também apresentaram progressos significativos em termos de objetivos pessoais (acadêmicos, interpessoais e de saúde) na comparação com os demais.
Outras influências sobre a saúde física e psíquica ficaram perceptíveis numa pesquisa com adultos portadores de doença neuromuscular. Os que fizeram um exercício diário de gratidão durante 21 dias exibiram doses bem mais altas de bom humor, otimismo e de sensação de estar ligado aos outros, além de melhoras na duração e na qualidade do sono.
Numa experiência na qual adultos jovens faziam exercícios diários de gratidão, os pesquisadores notaram um aumento nos níveis de vivacidade, entusiasmo, determinação, atenção e energia na comparação com os grupos de controle. As pessoas que manifestaram gratidão também eram mais propensas a informar que haviam ajudado ou dado apoio emocional a alguém.
De um ângulo mais espiritual, segundo Emmons, a gratidão independe de crenças religiosas, mas a fé amplia a capacidade de manifestá-la. As pessoas gratas têm uma tendência maior a crer a interconexão de todas as formas de vida, a firmar um compromisso com os outros e ser responsável por eles. Quem manifesta gratidão dá menos importância a bens materiais, é menos invejoso e tende a partilhar mais suas posses com os outros.
Tudo isso não surge, porém, a partir de episódios esparsos de gratidão, alerta Sonja Lyubomirsky, professora de psicologia na Universidade da Califórnia em Riverside. Para colher os frutos dessa emoção, afirma ela, é necessário exercitá-la constantemente. “Se você não fizer isso regularmente, não obterá os benefícios”, explica. “É como se você fosse para a academia de ginástica uma vez por ano. O que ganharia com isso?”
O filtro do sexo
Todd Kashdan, professor adjunto de psicologia da Universidade George Mason (EUA), mostrou que a gratidão pode se manifestar de maneira diversa em homens e mulheres. Em um estudo, ele solicitou a estudantes do nível médio e adultos mais velhos que descrevessem e avaliassem um episódio recente no qual haviam recebido um presente. Kashdan notou que, na comparação com os homens, as mulheres participantes descreveram ter sentido uma carga e uma obrigação menores e níveis de gratidão mais elevados quando ganharam o presente. Os homens mais velhos apresentaram um dado adicional relevante: relataram emoções negativas mais intensas quando o presenteador era outro homem.
“A maneira pela qual fomos socializados quando crianças afeta o que fazemos com nossas emoções quando adultos”, afirma Kashdan. “Como os homens são em geral ensinados a controlar e a ocultar suas emoções mais suaves, isso pode estar limitando seu bem-estar.”