Na vasta gama de distúrbios psíquicos que nos acossam, a bipolaridade e demais transtornos de humor tornaram-se verdadeiros campeões. A maior parte das suas vítimas, no entanto, não tem consciência clara de estar doente e, por isso, rejeitam o tratamento
Por: Luis Pellegrini
A bipolaridade é uma das principais disfunções psíquicas da atualidade. Trata-se de doença facilmente reconhecível: são chamadas bipolares as pessoas que apresentam variações súbitas e extremas do seu estado de humor, passando da euforia à depressão, e vice-versa, sem aviso prévio e nem causa real aparente. Sua existência oscila entre estados de hiperatividade física e mental, e fases de depressão, inibição, lentidão para conceber e realizar ideias, e ansiedade ou tristeza. Juntos, estes sintomas são comumente conhecidos como depressão maníaca.
Desde já, é necessário não confundir tais transtornos comportamentais com as normais flutuações do humor. Nossa natureza psíquica quase nunca é totalmente estável, e todos estamos sujeitos a infinitas variações entre a alegria e a tristeza, o entusiasmo e a apatia, a agitação e a quietude. Tais altos e baixos nada têm de anormal ou patológico. Ao contrário, acredita-se que a dinâmica desses estados seja fator importante para o desenvolvimento e a maturação das nossas capacidades psíquicas. Como as fases da Lua, nossa psique vai se transformando, muito vezes em ciclos bastante regulares.
O problema aparece quando alguns limites são superados. O próprio doente com frequência não percebe que suas flutuações estão indo longe demais. Um bom indicador para isso são as pessoas que convivem com o bipolar, os familiares, os amigos e colegas de trabalho: o comportamento bipolar rapidamente se torna muito incômodo e perturbador para quem está ao redor. Em casos muito graves e que perduram indefinidamente no tempo, sua influência no meio social pode ser desestruturadora e inclusive desencadear nas outras pessoas potenciais patológicos que, até então, se mantinham sob controle.
Bipolaridade, oficialmente, não é considerada loucura, e portanto não dá o status de alienação mental. Apesar disso, nas fases agudas da doença – tanto nas crises de depressão quanto nas de exaltação maníaca -, o doente em geral não apresenta as qualificações necessárias que lhe atribuam plenos poderes das suas faculdades mentais.
No passado, o doente de distúrbio bipolar era também comumente chamado de “maníaco-depressivo”. Essa expressão, hoje considerada pejorativa, já não é usada pela moderna psiquiatria. A ela prefere-se o termo depressão maníaca para descrever o espectro bipolar como um todo, que inclui tanto o distúrbio bipolar como a depressão; os psiquiatras agora utilizam distúrbio bipolar para descrever a forma bipolar da depressão maníaca. A natureza e duração dos episódios variam grandemente de uma pessoa para outra, tanto em intensidade quanto em duração. O importante é levar-se em contas que, nos casos graves, pode haver risco pessoal e material.
Existem indicativos de fatores genéticos – indivíduos com casos de transtorno de humor na família são, estatisticamente, mais sujeitos a desenvolver a doença. O estresse é o principal desencadeante, e o transtorno pode ocorrer em qualquer faixa etária, embora a média de aparecimento seja por volta dos trinta anos.
Hoje em dia existe uma série de medicamentos denominados estabilizadores do humor e antipsicóticos que trazem grandes melhoras às pessoas acometidas, podendo ter, na maioria das vezes, bom curso e prognóstico.
Muitos possuem o transtorno sem ter um diagnóstico elaborado. Por tal razão, muito tempo pode se passar até que, superados os tabus e preconceitos (tanto os dos familiares quanto, sobretudo, os do próprio doente) venha-se a procurar tratamento com um profissional competente – o psiquiatra, e também o psicólogo. São comuns os processos de manifestação de um transtorno de humor cujo desenvolvimento dure anos, às vezes décadas. As crises no início são espaçadas, e quase não se percebe a diferença dos sintomas para os traços de personalidade do indivíduo, ou mesmo episódios isolados de tristeza, ou de muita alegria, de competência nos trabalhos ou estudos, de sensualidade, ou de um certo descuido com a vida financeira. Por vezes, o diagnóstico nunca chega a ser dado, e o doente (nesses casos considerado apenas um “nervoso”, um “excêntrico”, um “agressivo”, um “chato”) passa uma vida inteira entre altos e baixos, sofrendo e causando sofrimento. Estima-se que, hoje, entre 5% a 8% das populações sofra de alguma forma de transtorno de humor. As estatísticas também apontam que, infelizmente, apenas 1 dentre cada 4 casos seja efetivamente diagnosticado e tratado.
Um dos principais problemas da fase maniaca é o indivíduo impulsivamente se endividar, abusar de drogas e/ou fazer sexo com inúmeros parceiros diferentes por conta da libido aumentada.
Sintomas da depressão
O indivíduo deprimido em geral se sente abatido, quieto e triste. Pode dormir muito, como uma fuga ao convívio social, reclamar de cansaço em tarefas simples como escovar os dentes, apresentar traços de baixa auto-estima e de sentimentos de inferioridade. Demonstra pouco interesse pelos acontecimentos e coisas e pode se isolar da família e amigos.
O indivíduo pode se sentir, nesta fase, culpado por erros do passado e por fracassos em sua vida e de seus familiares. Pode haver irritabilidade, lamentos, e auto-recriminação.
Pode haver um distúrbio do apetite, tanto para aumentá-lo como para diminuí-lo. O deprimido pode apresentar queda na sua imunidade, o que o deixa mais predisposto a contrair doenças. Em alguns casos a depressão pode se manifestar de forma psicossomática, e o indivíduo pode apresentar algumas doenças de causa psicológica, que normalmente se caracterizam por dores pelo corpo ou cabeça.
Há uma queda da libido e o indivíduo pode se afastar de seu companheiro, se o possuir.
São comuns nessa fase pensamentos autodestrutivos e até mesmo suicidas, uma vez que o indivíduo se sente mal em sua vida e sem energia para mudá-la. A consequência mais grave de uma depressão pode ser a concretização do suicídio.
Sintomas da euforia (mania)
Na fase eufórica o indivíduo pode apresentar sentimentos de grandiosidade, poderes além dos que possui e grande entusiasmo. Ele passa a dormir pouco, tornar-se agitado. Em casa e no trabalho pode se mostrar hiperativo, movendo-se o tempo todo, com dificuldade para ficar quieto.
Pode falar muito, ter muitas ideias ao mesmo tempo, seus pensamentos tornam-se bem mais acelerados, formando linhas de raciocínio difíceis de serem compreendidas por outras pessoas.
Há uma alteração na libido e o indivíduo tem um aumento do desejo sexual. É comum a bipolares terem vários parceiros sexuais a cada episódio.
O indivíduo perde a inibição social, podendo passar por situações vexatórias por falta de senso crítico.
Também é comum a irritabilidade, que associada com a impulsividade, pode levar o indivíduo a se envolver em mais brigas.
Nessa fase é comum os indivíduos se endividarem ou perderem muito dinheiro, comprometendo até bens de família. Durante os delírios de grandeza os gastos são muito acima do que sua realidade permitiria. Devido ao grande otimismo, é possível que o indivíduo empreste dinheiro a pessoas a quem mal conhece, e que podem estar aproveitando-se da situação.
São comuns manias como perseguição, realização de sonhos (reformas, viagens, compras) que a primeira vista podem até parecer normais.
No tipo de THB com surtos psicóticos, é comum o paciente ter alucinações e delírios de grandeza.
Os estabilizantes de humor diminuem o excesso de atividade neural em episódios de euforia.
O transtorno bipolar não tem cura, porém possui tratamento através de medicamentos cada vez mais avançados, a medicina tem evoluído muito nessa área. Até pouco tempo atrás, os pacientes com transtorno bipolar ficavam internados em hospícios e eram tratados com eletrochoques. Atualmente podem contar com uma série de remédios antidepressivos, estabilizadores do humor e ansiolíticos. Tais medicamentos devem ser ministrados a cada paciente de forma personalizada, segundo as características de cada estágio da doença, e da resposta à dosagem medicamentosa. Encontrada a fórmula personalizada correta, e desde que o paciente siga as indicações, ele pode ter uma vida praticamente normal, sem internações. Só em casos muito graves ele é internado, e mesmo assim, geralmente, em hospitais-dia, onde se fazem terapias ocupacionais durante o dia e, à noite, os pacientes voltam ao convívio de suas famílias.
Como controlar as oscilações de humor
Para controlar as mudanças de humor é necessário regularmente:
Acompanhamento por médico (psiquiatra) e psicólogo.
Uso da medicação prescrita conforme recomendação médica.
O uso regular da medicação é particularmente importante porque é muito comum o paciente de bipolaridade interromper a terapia medicamentosa sob a alegação, por exemplo, de que “ela está amortecendo a minha libido”. A interrupção no uso do medicamento recomendado, via de regra, desencadeia novos episódios da conduta característica a essa condição: estados de depressão mais intensa e maior exaltação na euforia.
Restrição ao uso de álcool, drogas e cafeína.
Vida saudável com horas de sono suficientes e em horário regular, alimentação equilibrada e atividade física adequada.
Originally posted 2017-04-13 14:07:44.