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Transtorno bipolar. A importância do fator genético

O Dia Mundial do Transtorno Bipolar, a 29 de março, reuniu especialistas em vários lugares, e serviu para lembrar que os fatores genéticos contribuem em 60% para a aparição dessa doença, em interação com fatores psicológicos e ambientais.

Por: Cécile Thibert. Le Figaro Santé

Fonte: Revista Saúde 247

Tudo começa com um pequeno toque de depressão, seguido por uma fase de exaltação chamada de “maníaca”. Entre as duas, surge uma calma plácida, pelo menos na aparência. Na realidade, cada emoção experimentada desencadeia nas pessoas atingidas por um transtorno bipolar um “tsunami”, uma “epilepsia mental”, um “incêndio emocional” – expressões cunhadas pelos próprios pacientes.

Um pouco mais tarde, a depressão reaparece, instala-se durante semanas, meses, antes de novamente ceder lugar para a euforia. “Uma pessoa que sofre de transtornos bipolares é presa de uma grande instabilidade emocional e uma falta de comunicação entre as emoções e a razão”., explica o médico Daniel Souery, psiquiatra do Centro Psypluriel em Bruxelas.

Os transtornos bipolares, que tocam cerca de 1% da população europeia, são fortemente hereditários. Se ambos os pais forem bipolares, a criança corre um risco em cada dois de desenvolver a doença.

“Acreditamos que os fatores genéticos contribuem em 60% no surgimento dos transtornos bipolares”, afirma o médico Stéphane Jamain, do Instituto Mondor de Pesquisas Médicas, de Créteil (Inserm). “Muitos estudos mostraram que os mesmos genes podem estar implicados em várias patologias psiquiátricas”. Stéphane Jamain e sua equipe estão agora empenhados na decriptação do DNA de pessoas com transtorno bipolar e o de pessoas com esquizofrenia. “O objetivo é redefinir a cartografia das doenças psiquiátricas a partir de marcadores genéticos, e não mais apenas com base nos dados obtidos em uma consulta médica”, ele explica.

Para que servem os genes identificados? “Tratam-se notadamente de genes que codificam as moléculas que possuem um papel essencial na função dos neurônios”, conta o pesquisador. Outros genes são responsáveis pelo bom funcionamento de circuitos de neurotransmissores, tais como a dopamina, a serotonina ou os glutamatos. “Admite-se comumente que a origem dos transtornos bipolares residem nas anomalias de estrutura e de funcionamento dos circuitos cerebrais implicados no controle e gestão das emoções”, explica Daniel Souery.

Traumatismos da infância

Os genes, no entanto, não são os únicos responsáveis. Acontecimentos ocorridos muito cedo na vida do indivíduo exercem igualmente um peso importnte no desencadeamento dos transtornos bipolares. “Estudos demonstram que as pessoas expostas a traumatismos durante a infância são mais vuloneráveis”, explica o médico Bruno Etain, psiquiatra responsável do Centro Expert de Transtornos Bipolares Fernand-Widal. “Mas atenção: não devemos concluir que os parentes das pessoas que sofrem de bipolaridade necessariamente lhes infligiram maus tratos”, insiste o médico.

“Tais fatores vão acarretar, durante o desenvolvimento da pessoa, perturbações sutis ao nível do cérebro; este, fragilizado, irá descompensar toda vez que tiver de confrontar fatores ambientais correlatos à doença”.

Fatores que conduzem aos transtornos bipolares: Maus tratos durante a infância; consumo de substâncias tóxicas pela mãe durante a gravidez; consumo de maconha e de álcool; transtornos do sono; conflitos familiares; problemas no trabalho. Tais fatores, associados à vulnerabilidade genética do indivíduo conduzem a perturbações do desenvolvimento neurológico que, por sua vez, levam ao transtorno bipolar.

O período entre o fim da adolescência e o começo da idade adulta é igualmente determinante. O transtorno bipolar aparece quase sempre antes dos 30 anos, com mais frequência ao redor dos 25 anos. “Entre um terço e a metade dos pacientes jovens que começam a manifestar a doença são consumidores regulares de maconha pou de álcool”, informa o médico Etain. Outros estudos mostram que as pessoas que têm um sono irregular durante a adolescência têm um risco mais importante de desenvolver transtornos bipolares. Por fim, está  claramente estabelecido que o estresse, a ansiedade, mesmo menores, participam do desencadeamento da doença.

Curiosidades sobre os transtornos bipolares

Uma doença jovem – O termo “transtorno bipolar” começou a ser utilizado só após 1980. Nesse ano, a Associação Americana de Psiquiatria publicou o terceiro Manual Diagnóstico e Estatístico dos transtornos mentais. Os autores decidem, nessa ocasião, excluir todos os termos de origem psicanalítica e substituir “estado maníaco-depressivo” por “transtorno bipolar”.

Um tratamento descoberto na Antiguidade – Desde o primeiro século antes de Cristo, Soranus de Éfeso, na Ásia Menor (hoje Turquia) observou que os banhos de sal da região, ricos em lítio, exercem um efeito calmante nos pacientes agitados. Será no entanto necessário esperar o final dos anos 1800 para que esse metal alcalino seja novamente utilizado por suas propriedades de estabilizador do humor. Desde o final dos anos 1950, este é o tratamento mais eficaz para estabilizar a longo prazo os transtornos bipolares.

O lítio na água das torneiras para prevenir os suicídios – Vários estudos mostraram que uma certa concentração de lítio na água potável, mesmo bem fraca, pode diminuir o risco de suicídio. As regiões com as taxas mais elevadas de lítio nas águas servidas à população são também as que têm os menores índices de suicídios, e vice-versa.

Todos podemos ser bipolares – Pesquisadores mostraram que pessoas amorosas e sensíveis podem apresentar as mesmas características de pessoas afetadas por transtornos bipolares. Para chegar a essa conclusão, eles compararam os resultados de questionários respondidos por adolescentes apaixonados e os de adolescentes que sofrem de um transtorno bipolar de tipo 2. Resultado: impossível distinguir esses dois grupos de pessoas!

Os bipolares são criativos – Um laço estreito existe entre os transtornos bipolares e a criatividade. Com efeito, quando os indivíduos bipolares estão numa fase de hipomania (de excitação), seus transtornos são menos fatigantes, mais impulsivos. Em resumo, apresentam condições que favorecem a criatividade. Vincent van Gogh, Friedrich Nietzsche, Johann Wolfgang von Goethe, Ludwig van Beethoven, Virginia Woolf sofriam de transtornos bipolares.

Dez anos para se ter o diagnóstico da doença – Os transtornos bipolares atingem entre 1% a 2,5% da população. Mas verificou-se que na Europa os diagnósticos costumam ser concluídos com dez anos de atraso.

Desde a infância o indivíduo apresenta sinais da moléstia – As crianças ansiosas e que sofrem de distúrbios do sono correm um risco maior de desenvolver um transtorno bipolar. Da mesma forma, o fato de se sofrer de sintomas depressivos já na adolescência parece ligado a um aumento do risco de desenvolver algum transtorno bipolar. O pico do início da doença se situa entre os 15 e os 25 anos, mas o transtorno bipolar pode começar mais precocemente.

Uma doença presente em toda a parte no mundo – Muitos estudos mostram que as taxas de pessoas que sofrem de distúrbios bipolares dos tipos 1 e 2 são praticamente as mesmas nos diferentes países ao redor do mundo.