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Direita, esquerda, volver!

 

Minha amiga e leitora Maria Célia Furtado me pede que escreva alguma coisa sobre o significado dos termos “direita” e “esquerda”, como designativos de posições político-ideológicas iguais e contrárias. Ela quer saber qual é a origem dessa classificação

Por: Luis Pellegrini

A pergunta é oportuna – Obrigado pela lembrança, Maria Célia! – sobretudo no momento cultural que vivemos em nosso país, já que ela raramente é colocada e respondida, até mesmo nas escolas. Haja visto que boa parte dos nossos próprios políticos confundem as coisas. Não são poucos os que, se apresentando como de esquerda, defendem políticas de direita. E vice-versa… Mas isso é outra conversa, que faz parte do Febeapá (Festival de Besteira que assola o país, há séculos, na expressão genial cunhada pelo cronista Stanislaw Ponte Preta). Ou será que um dia conseguiremos esquecer o espetáculo de circo que foi a votação do impeachment de Dilma Rousseff na Câmara dos Deputados em Brasília, na qual nossos ilustrados parlamentares, em vez de votar em nome de si próprios e dos mandatos que lhes foram conferidos pelo povo, preferiram fazê-lo em nome dos filhos recém nascidos, das mamãezinhas queridas, das vovós, das namoradas, dos cachorros e gatos, dos periquitos e até da perereca da vizinha?

Deixemos de lado essas digressões estéreis. O mais importante é que, nos dias que correm, observamos na mídia de massa e também nas redes sociais discussões acaloradas a respeito de posicionamento político. Até mesmo eu que, reconheço com humildade, sou um tanto apático diante de temas que me lembram a metafísica do sexo dos anjos, ou o dilema transcendental eterno sobre o que veio primeiro, o ovo ou a galinha, fui cobrado por alguns poucos leitores, no período da campanha eleitoral, a me definir em termos de posicionamento político. Afinal, de que lado você está? É da esquerda ou da direita?

Mas reconheço ser importante conhecer mais precisamente a diferença entre uma coisa e outra, até mesmo para que seja possível responder a perguntas como as que me fizeram. Para que isso fique bem explicado, é preciso nos reportarmos à França do ano 1789, quando estava sendo deflagrada a famosa Revolução.

Allons enfants de la patrie!

E aí, quem explica é o filósofo inglês Roger Scruton, em sua obra “Os Pensadores da Nova Esquerda: “O uso moderno do termo ‘esquerda’ deriva da Assembleia dos Estados Gerais de 1789, quando, na França, a nobreza sentou-se à direita do rei, e o Terceiro Estado, à sua esquerda. Poderia ter sido o contrário. Na verdade, era o contrário para todo o mundo, menos para o rei. Contudo, os termos ‘esquerda’ e ‘direita’ permanecem conosco e são agora aplicados a facções e opiniões em toda ordem política.”

A Assembleia dos Estados Gerais foi instituída com o objetivo de decidir os rumos da França após o turbilhão de revoltas que sacudiu o país em 1789. Os lados à esquerda e à direita do rei passaram, com o tempo, a simbolizar posturas políticas associadas às figuras que ocuparam tais lados, isto é, radicais e revolucionários à esquerda, e conservadores e moderados à direita. Tais posições foram adotadas com entusiasmo, até mesmo porque facilitavam muito as votações da miríade de questões que tinham de ser debatidas e decididas naquele período tão revolucionário da história da humanidade. Quem quer abolir essa lei? Os que querem abolir sentem-se à esquerda; os que querem conservá-la sentem-se à direita. E alguém fazia a contagem. Simples assim. Desses posicionamentos, como bem diz Scruton, até hoje ainda permanecem os ecos nas discussões entre as facções políticas simpatizantes de uma ou de outra corrente.

E, dentro dessa perspectiva, creio poder agora responder àquelas perguntas: Quando quero que seja aprovada uma nova lei, que julgo revolucionária e útil, sento-me à esquerda. Quando considero melhor que as coisas se mantenham como estão, sento-me à direita. Quem manda na minha cabeça sou eu, não é um partido e nem uma ideologia. E fim de papo.

 As coisas depois evoluíram

Mas, para quem quer aprofundar o assunto, é necessário também entender quais foram os desdobramentos da perspectiva revolucionária de ideologias como o comunismo (idealizado por Karl Marx), o anarquismo (que tem como um dos principais expoentes o russo Mikhail Bakunin) e o sindicalismo, que estão associadas à esquerda; bem como de ideologias de cunho autoritário, como os nacionalismos da virada do século 19 para o século 20, que alguns autores tradicionalmente associam à direita.

Há ainda, generalizando bastante as coisas, o problema do nazismo e do fascismo, que, mais do que tudo, foram movimentos políticos coletivistas e totalitários, mas são identificados pelos intelectuais de esquerda como movimentos de direita e por intelectuais de direita como movimentos de esquerda. Um saco de gatos, como podemos perceber. Essa troca de acusações permeou muitas discussões ao longo do século 20. Tais debates iam desde a perspectiva econômica até a postura moral dos líderes que representaram cada uma dessas denominações. No Brasil atual, em pleno século 21, eles prosseguem a todo vapor. Embora, com raras exceções, aqui não se consiga mais detectar um político com comportamento claro de direita ou de esquerda segundo as acepções clássicas desses termos. Quase todos atuam apenas como defensores dos seus interesses pessoais e os do grupo a que pertencem. Ou seja, farinha do mesmo saco…