As condições de saúde dos ambientes naturais terrestres e das espécies que neles vivem sofrem uma piora grave e constante.
Por: Equipe Oásis
Um quarto das mortes prematuras e das doenças que proliferam atualmente no mundo estão relacionadas à poluição e a outros danos ao meio ambiente provocados pelo homem. O alerta é feito pela ONU em um relatório sobre o estado do planeta, divulgado a 13 de março último em Nairóbi, capital do Quênia.
O relatório, chamado de GEO (Global Environement Outlook), é resultado do trabalho de 250 cientistas de 70 países, durante seis anos. O documento utiliza uma base de dados gigantesca para calcular o impacto da poluição sobre centenas de doenças, além de listar uma série de emergências sanitárias no mundo.
Segundo o GEO, a poluição atmosférica, os produtos químicos que contaminam a água potável e a destruição acelerada dos ecossistemas vitais para bilhões de pessoas estão provocando uma espécie de epidemia mundial.
As condições ambientais “medíocres” são responsáveis por cerca de 25% das mortes prematuras e doenças no planeta. A poluição do ar mata entre 6 e 7 milhões de pessoas por ano. Já a falta de acesso à água potável mata 1,4 milhão de pessoas a cada ano devido a doenças que poderiam ser evitadas, como diarreias.
O relatório também indica que produtos químicos despejados no mar provocam efeitos negativos na saúde de várias gerações. Além disso, 3,2 bilhões de pessoas vivem em terras destruídas pela agricultura intensiva ou pelo desmatamento.
Já a utilização desenfreada de antibióticos na produção alimentar pode resultar no surgimento de bactérias ultrarresistentes, que poderiam se tornar a primeira causa de mortes prematuras até a metade do século.
Desigualdades entre Norte e Sul
O documento também revela outros problemas provocados pelas imensas desigualdades entre os países ricos e pobres. O consumo excessivo, a poluição e o desperdício alimentar no Hemisfério Norte resultam em fome, pobreza e doenças para o Sul.
“Ações urgentes e de uma amplitude sem precedentes são necessárias para pausar e inverter essa situação”, indica a conclusão do relatório. Para os autores do documento, sem uma reorganização da economia mundial em direção a uma economia sustentável, até mesmo o conceito de crescimento mundial pode ser questionado, diante da alta quantidade de mortes e custos dos tratamentos.
“A principal mensagem é que se você tem um planeta saudável, isso vai ter impacto positivo não apenas no crescimento mundial, mas na vida dos pobres, que dependem do ar puro e da água limpa”, afirma Joyeeta Gupta, vice-presidente do GEO.
Se, como mostram os estudos da GEO, os desmandos da produtividade e do consumismo insustentáveis comprometem a saúde e a própria existência de um número cada vez maior de pessoas, eles também não poupam o próprio planeta da sua sanha avassaladora.
Um outro estudo de amplo espectro que acaba de ser publicado, foi produzido pelo IPBES – Intergovernmental Science-Policy Platform on Biodiversity and Ecosystem Services. Seus autores afirmam que se a situação climática da Terra está na ordem do dia (para confirmar os perigos ligados às mudanças climáticas ou para tentar desmenti-los com afirmações irritantes e ridículas) o mesmo não pode ser dito a respeito dos estudos de sistemas ainda mais complexos, os ambientes terrestres, sobre os quais baseia-se a sobrevivência da nossa espécie. Para o IPBES, o discurso sobre o entrelaçamento das dinâmicas entre plantas, animais, bactérias e o meio ambiente terrestre – que constitui um ecossistema e a sua biodiversidade – conquista agora um novo nível de atenção graças às conclusões a que esse estudo chegou.
Embora tenha sido constituído pela ONU, o IPBES é uma agência intergovernamental independente, que procura reforçar e incrementar o papel da ciência nas políticas que dizem respeito ao meio ambiente. Ele publicou diversos estudos e relatórios, inclusive sobre temas mais circunscritos, como a polinização, e também sobre os serviços prestados pelos ecossistemas – ou seja, aquilo que a natureza “fornece” ao ser humano para a sua sobrevivência, calculado inclusive como valor monetário.
Sexta Grande Extinção
Um desses estudos, o Relatório #IPBES7 é fruto de um trabalho coletivo de 145 especialistas provenientes de 50 países, que trabalharam durante três anos debruçados sobre mais de 15 mil trabalhos científicos. Ele calculou, por exemplo, que a taxa de extinção e desaparecimento de populações e espécies animais e vegetais é atualmente muito superior à taxa natural “de base”, e é comparável à taxa das cinco grandes extinções que ocorreram no planeta no passado. Alguns pesquisadores consideram que a globalidade e a velocidade do fenômeno na atualidade já permite classificar esses eventos como uma sexta grande extinção.
Pelo menos 680 espécies de vertebrados foram eliminados pelas atividades humanas do século 16 até os dias de hoje. Para um total estimado de oito milhões de espécies existentes no planeta (esse número provavelmente é maior) pelo menos um milhão encontra-se ameaçado de extinção no prazo de poucos décadas.
Mais de 9% das raças de animais usados na agricultura já desapareceram; existe pelo menos um outro milhar de raças ameaçadas.
Plantas e animais desaparecem
Para além do efetivo desaparecimento de alguns grupos particularmente ameaçados, como os anfíbios, o relatório do IPBES afirma que a abundância média das espécies nos diversos ambientes diminuiu pelo menos 20%.
Isso significa que, embora não estejam completamente extintas, muitas populações de animais e vegetais viram seu número diminuir, muitas vezes de maneira drástica. Pelo menos 33% dos corais das barreiras coralinas e mais de um terço dos mamíferos marinhos estão ameaçados. Embora a contagem deles seja difícil, parece que pelo menos 10% dos insetos esteja ameaçado.
AS CINCO PRAGAS
As causas de tudo isso podem ser, quase todas, reconduzidas às atividades humanas. O relatório as sintetiza em cinco principais cenários de extinção ou diminuição das espécies: as mudanças e transformações que produzimos na superfície dos continentes e nas águas dos mares; a exploração direta e insustentável dos organismos vivos; as mudanças climáticas; a poluição; as espécies invasoras.
1) Continentes e oceanos: três quartos dos ambientes terrestres e cerca de 66% dos ambientes marinhos já foram alterados de maneira significativa pelas atividades humanas. Apenas 13% dos oceanos ainda não está contaminado.
2) Terra, água e alimentação: mais de um terço da superfície das terras emersas e quase 75% da água doce disponível são usados para a pecuária e a agricultura intensiva.
3) Alimentação, pesca: com base nos dados de 2015, 33% dos estoques de peixes marinhos são atualmente pescados em níveis insustentáveis.
4) Microplásticos e alimentação: a poluição do meio ambiente marinho e terrestre por plásticos e microplásticos aumentou dez vezes de 1980 aos dias de hoje. Desde a invenção desse produto, o ser humano já produziu cerca de 8,3 bilhões de toneladas de plástico.
5) Atividades industriais, poluição: de 300 a 400 milhões de toneladas de metais pesados, solventes, barro tóxico e outros rejeitos industriais são descarregados nas águas do planeta a cada ano.
O que podemos fazer diante do descalabro
Em todos os cenários de política ambiental estudados no relatório, as tendências à super exploração dos recursos do planeta e à extinção de espécies continuarão até 2050 e além. O trabalho do IPBES apresenta no entanto um amplo espectro de ações úteis a diminuir e mitigar as consequências dessa corrida insustentável. Além de tudo aquilo que podemos fazer individualmente, são necessárias ações coletivas de grande porte, de escolha de políticas econômicas e, sobretudo, de decidida vontade política por parte das nações.