Plantas conversam, flores constroem elaboradas armadilhas e algumas espécies conseguem inclusive retornar do reino dos mortos. Você não acredita? Veja o que o botânico italiano Stefano Mancuso tem a dizer.
Vídeo: TED – Ideas Worth Spreading
Tradução: Eduardo Schenberg. Revisão: Claudia Solano.
Plantas demonstram ter comportamento inteligente numa grande variedade de modos e situações: lutando contra predadores, maximizando as oportunidades de nutrição, adaptando-se como nenhum outro ser vivo ao meio ambiente. Mas podemos afirmar que elas possuem formas próprias de inteligência? O botânico italiano Stefano Mancuso conseguiu obter intrigantes evidências dessa realidade.
Stefano Mancuso é o fundador de uma nova disciplina, a neurobiologia das plantas, que explora os sinais que evidenciam a comunicação em todos os níveis da organização biológica dos vegetais, desde a genética até as questões moleculares, desde as células até as comunidades ecológicas.
Stefano Mancuso, afirma e prova com suas experiências que as plantas são capazes de desempenhar modalidades incrivelmente sofisticadas e dinâmicas de comunicação e de consciência.
A partir de seu laboratório nos arredores de Florença ( http://www.linv.org/ ), Mancuso e sua equipe exploram como as plantas se comunicam enviando “sinais” umas às outras, como usam um complexo sistema de análises internas para encontrar nutrientes, para se reproduzir e até para se defender contra predadores. Os resultados obtidos pelos estudos de Mancuso estão continuamente transformando nossa visão das plantas de simples organismos a complexas estruturas de comunidades ecológicas capazes de adquirir, processar e – incrivelmente – transmitir importantes informações.
Vídeo: Palestra de Stefano Mancuso no TED
Tradução integral da palestra de Stefano Mancuso:
As vezes folheio revistas muito antigas. Encontrei este teste de observação sobre a história da arca de Noé. E o artista que desenhou isso cometeu erros, tem alguns enganos. Algo em torno de 12 erros. Alguns são muito simples. Há uma chaminé, uma parte aérea, uma lâmpada e um mecanismo de corda na arca. Alguns erros são sobre os animais, o número deles. Mas há um erro muito mais fundamental na história toda da arca que não aparece aqui. E o problema é: onde estão as plantas? Então agora temos Deus que irá submergir a Terra permanentemente, ou pelo menos por um período bem longo, e ninguém está cuidando das plantas. Noé tinha que levar dois exemplares de cada tipo de pássaro, de cada tipo de animal, de cada tipo de criatura que se move, mas não há qualquer menção sobre plantas. Por que? Em outra parte da mesma história, todas as criaturas vivas são apenas aquelas que saíram da arca – pássaros, gado e animais selvagens. Plantas não são criaturas vivas. Este é o ponto. Este é um argumento que não saiu da Bíblia, mas é algo que sempre acompanhou a humanidade.
Vamos ver este belo código presente em um livro da Renascença. Aqui temos a descrição da ordem da natureza. É bacana por que começa da esquerda – temos as pedras – imediatamente depois as pedras, as plantas que são apenas capazes de viver. Depois os animais, que vivem mas também sentem, e, no topo da pirâmide, temos o homem. Mas este não é o homem comum. É o “homo estudiosus” – o homem estudioso. Isto é bem reconfortante para pessoas como eu – sou um professor – e isto deveria estar encerrado ali, no topo da criação. Mas é algo completamente errado. Vocês conhecem muito bem os professores… Mas também está errado quanto as plantas, por que as plantas não são capazes apenas de viver; elas são capazes de sentir. São muito mais sofisticadas do que os animais em matéria de saber perceber as coisas. Apenas para dar um exemplo, todo ápice de raiz é capaz de detectar e monitorar simultânea e continuamente pelo menos 15 parâmetros químicos e físicos. E também são capazes de realizar comportamentos maravilhosos e complexos que podem ser descritos apenas com o termo inteligência. Bem, mas isto é algo – esta subestimação das plantas – é algo que sempre esteve conosco.
Vamos ver este pequeno filme agora. Com David Attenborough. Ele é realmente um amante das plantas. Fez alguns dos mais belos filmes sobre comportamento das plantas. Quando ele fala sobre plantas, tudo está em correto. Quando fala de animais, ele tende a esquecer o fato de que plantas existem. “A baleia azul, a maior criatura que existe no planeta.” Isto está errado, totalmente errado. A baleia azul é uma anã se comparada com a maior criatura de verdade que existe no planeta – que é, essa maravilhosa, magnífica Sequoiadendron giganteum, uma sequoia gigante). E isto é um organismo vivo que pesa pelo menos 2 mil toneladas.
A história de que plantas são organismos pouco desenvolvidos foi formalizada muito tempo atrás por Aristóteles, que em “De Anima” – um livro muito influente para a civilização ocidental – escreveu que as plantas estão no limiar entre o vivo e o não vivo. São apenas um tipo bem baixo de alma, que se chama alma vegetativa, porque não se movem, e então não precisam sentir. Vejamos.
Ok, alguns movimentos das plantas são bem conhecidos. Este é um movimento rápido. Esta é a Dionaea, uma vênus pega-moscas caçando lesmas. Pobre lesma. Isto foi negado por séculos, apesar da evidência. Ninguém podia dizer que uma planta poderia comer um animal, porque seria contra a ordem da natureza. Mas plantas também são capazes de realizar muitos movimentos. Alguns são bem conhecidos, como o florescimento. É apenas uma questão de usar algumas técnicas como acelerar vídeos. Alguns são muito mais sofisticados. Veja este jovem feijão que se move para captar luz o tempo todo. E é tão gracioso. É como um anjo dançarino. Elas também são capazes de brincar. Estão realmente brincando. Estes são pequenos girassóis, e o que estão fazendo não pode ser descrito com nenhum outro termo além de brincadeira. Eles estão realmente treinando, como muitos pequenos animais o fazem, para a vida adulta, quando serão capazes de rastrear o sol o dia todo. Elas são capazes de responder à gravidade, claro, então os brotos estão crescendo contra o vetor de gravidade e as raízes crescem a favor do vetor de gravidade.
Mas as plantas também são capazes de dormir. Esta é uma Mimosa pudica (Dormideira). Durante a noite, elas dobram e fecham as folhas e reduzem o movimento, e durante o dia abrem as folhas – há muito mais movimento. Isto é interessante porque, esta maquinaria do sono, é perfeitamente conservada. É a mesma nas plantas, em insetos e em animais. E então se você precisa estudar este problema do sono, é mais fácil estudar em plantas, por exemplo, do que em animais, e é mais condizente com a ética. É um tipo de experimento vegetariano.
Plantas também são capazes de se comunicar. São comunicadoras extraordinárias. Se comunicam com outras plantas. Podem distinguir as que são semelhantes ou não. Elas se comunicam com plantas de outras espécies, e também com animais produzindo voláteis químicos, por exemplo, durante a polinização. Polinização é um assunto muito sério para as plantas, porque move o pólen de uma flor para outra, entretanto, elas não podem mover este pólen entre suas próprias flores. Então precisam de um vetor, e este vetor normalmente é um animal. Muitos insetos foram usados pelas plantas como vetores para o transporte de pólen, mas não apenas insetos; até pássaros, répteis, e mamíferos como ratos e morcegos são normalmente usados para transportar pólen. É um negócio sério. As plantas fornecem aos animais um tipo de substância doce – muito energética – ganhando em troca o transporte de pólen. Mas algumas plantas estão manipulando animais, como no caso das orquídeas que prometem sexo e néctar e não dão nada em troca pelo transporte de pólen.
Mas há um grande problema por trás de todo este comportamento que vimos. Como é possível fazer isso sem cérebro? Tivemos de esperar até 1880, quando um grande homem, Charles Darwin, publicou este maravilhoso, incrível livro que começou uma revolução. O título é “O Poder do Movimento em Plantas”. Ninguém tinha falado de movimento em plantas antes de Charles Darwin. Neste livro, escrito em colaboração com seu filho, Francis – que foi o primeiro professor de fisiologia das plantas no mundo, em Cambridge – eles levaram em consideração cada movimento por 500 páginas. E no último parágrafo do livro, como uma marca estilística, porque normalmente Darwin reservava, no último parágrafo de um livro, a mensagem mais importante. Ele escreveu que, “Não é exagero dizer que a ponta da radícula atua como um cérebro de um dos animais mais primitivos.” Isso não é uma metáfora. Ele escreveu cartas muito interessantes a um amigo que era presidente da Royal Society na época, portanto a autoridade científica máxima na Inglaterra, falando sobre o cérebro de plantas.
Então, esta é a ponta de uma radícula crescendo em uma rampa. Você pode reconhecer este tipo de movimento, o mesmo movimento que minhocas, cobras e qualquer animal que se mova pelo chão, sem pernas, é capaz de realizar. E não é um movimento simples, porque para realizá-lo, você precisa mover diferentes partes e regiões da raiz e sincronizá-las sem ter um cérebro. Então nós estudamos a ponta da radícula, e encontramos esta região específica que está aqui, representada em azul – vamos chamá-la de zona de transição. E esta região, é bem pequena. Menor que um milímetro. Nessa pequena região acontece a maior taxa de consumo de oxigênio nas plantas, e mais importante, você tem este tipo de sinal aqui. Os sinais que vocês estão vendo são potenciais de ação, os mesmos sinais que os neurônios do meu cérebro, do nosso cérebro, usam para trocar informações. Agora sabemos que o ápice da radícula contém apenas algumas centenas de células que possuem este tipo de característica, mas sabemos quão grande é a quantidade de radículas numa planta, como um centeio por exemplo. Temos praticamente 14 milhões de radículas. Temos 11,5 milhões de ápices de radículas e um comprimento total de 600 quilômetros ou mais e uma área enorme de superfície.
Agora vamos imaginar que cada ápice de radícula esteja trabalhando em rede com os demais. Temos, à esquerda, a internet e à direita, o aparato da raiz. Trabalham da mesma maneira. São uma rede de pequenas máquinas computacionais, trabalhando em rede. E por que são tão similares? Porque evoluíram pela mesma razão: sobreviver à predação. Trabalham do mesmo modo. Então você pode remover 90% das raízes e as plantas ainda continuam a trabalhar. Você pode remover 90% da internet e ela continua a trabalhar. Então, uma sugestão para as pessoas trabalhando com redes: plantas são capazes de dar boas sugestões sobre como desenvolver e evoluir redes.
E outra possibilidade é tecnológica. Imaginem que podemos construir robôs inspirados por plantas. Até agora, o homem foi inspirado apenas por ele mesmo e outros animais para fazer robôs. Nós temos os animaloides – os robôs típicos inspirado em animais, os insetoides etc. Temos os androides que são inspirados no homem. Por que não ter um plantoide? Se você quer voar, é bom olhar para os pássaros, se inspirar nos pássaros. Mas se você quer explorar solos, ou se quer colonizar novos territórios, a melhor coisa que pode fazer é se inspirar em plantas que são mestras em fazer isso. Temos ainda outra possibilidade que estamos trabalhando em nosso laboratório, que é construir híbridos. É muito mais fácil construir híbridos. Híbrido significa algo metade ser vivo metade máquina. É muito mais fácil trabalhar com plantas do que com animais. Elas têm capacidade computacional. Têm sinais elétricos. A conexão com a máquina é muito mais simples, e mais eticamente possível. E estas são três possibilidades que estamos trabalhando atualmente para construir híbridos, movidos por algas ou pelas folhas, ou pela parte mais poderosa das plantas, as raízes.
Bem, obrigado pela atenção. E antes de terminar, gostaria de assegurar que nenhuma lesma foi machucada pra fazer esta apresentação. Obrigado.